Ricardo Silva | Enfermeiro no UK | Sem dúvida recomendo este país de olhos fechados!
O meu nome é Ricardo Silva, e pertenço à geração de 1988. Nascido no Ribatejo, em Santarém, local onde me formei enquanto enfermeiro. Decisão esta tendo em conta as potencialidades da classe como um bem de primeira necessidade, não só em Portugal, como por todo o mundo. Sou lutador, orgulhoso e planeador. Gosto de pensar no futuro, e questionar-me sobre todas as opções envolventes.
Sou enfermeiro por adorar o relacionamento humano conjugado com a doença. Feito isto, sou emigrante desde os meus 23 anos, enfermeiro de cuidados intensivos 6 meses depois. Exerço funções no primeiro hospital público britânico com 100% de quartos privados, em Royal Tunbridge Wells, Inglaterra.
Porque a Inglaterra?
Sempre equacionei ir para o estrangeiro. Não só depois do curso mas também antes do curso. Há muitas realidades que devíamos experimentar, e essa oportunidade tornou-se real quando terminei o curso. Embora trabalhasse em Portugal, numa unidade de cuidados continuados, o trabalho não era gratificante, as viagens muito cansativas e não se sentia realizado. Equacionei todos os países que na altura procuravam enfermeiros, como os países de língua francesa e inglesa. Numa perspectiva futura, arrisquei Inglaterra, pelas potencialidades universitárias pós licenciatura, mobilização entres hospitais e o principal, a língua visto que existem muitos países extra europeus que abraçam este idioma, caso a Europa não tolere a crise.
Como se processou a escolha do local de trabalho?
A escolha de local de trabalho vem de acordo das necessiades do país, no meu caso do NHS (SNS de UK). O hospital que necessita de enfermeiros contacta uma agência, essa agência anuncia pela internet, vem a portugal com dois responsáveis do hospital, entrevista os enfermeiros que enviaram o currículo e contracta um determinado número de pessoas. Depois a agência marca um dia para viajarmos todos, arranjam-nos alojamento para as primeiras semanas e assim que começamos a trabalhar, deixamos de ser dependentes da agência. É bastante directo, e apenas nos temos que deixar levar pela corrente.
E a adaptação?
Como qualquer país, a adaptação pode ser complicada. Actualmente, Inglaterra pode ser um dos países mais fáceis em termos de adaptação, em conjunto com a França talvez, uma vez que tem todos os sítios se houve uma palavra em português. Há dois anos quando vim, tive sorte de ter 3 portugueses no meu serviço que me apoiaram. Hoje, temos pelo menos, 3 portugueses em cada serviço do meu hospital. No bloco operatório somos 20. No total ultrapassamos os 130. Somos muito acolhedores, o que torna tudo mais acessível. O facto de Inglaterra ser um dos países mais multicultural da europa faz com que a maior parte das pessoas com quem te relacionas vieram de outros países, pelo que compreendem a tua inexperiência e ajudam-te no que podem. O mais complicado de suportar é o facto de às 16h todas as lojas estarem fechadas, o que nos faz levantar cedo para aproveitar o dia.
Quais os principais constrangimentos encontrados, ao nível social e profissional?
Posso dizer que o facto de toda a legislação ser diferente, em conjunto com a língua torna tudo um pouco complicado. O país é rigido, controlador e é muito complicado escapar a alguma coisa. As rendas das casas também são altissímas, e para vir cá é preciso muito dinheiro para as primeiras semanas. A língua foi umas das coisas que mais receavas mas tornou-se bem fácil de ultrapassar. No entanto, algumas expressões britâncias como “Spend a penny (gastar um cêntimo)”, que significa ir à casa de banho, dificultaram o processo.
A nível profissional, apesar de virmos imensamente bem preparados de Portugal, os Hospitais exigem o certificado de alguns procedimentos, como algaliação, puncionar, e tirar sangue, muito por ser ainda de acordo com o ensino de enfermagem britânico. No entanto, pela segurança dos doentes e pela agitação do serviço, por vezes vimo-nos obrigados a ultrapassar o risco. Nos serviços há muita papelada a tratar, especialmente de Serviços Sociais, e são os enfermeiros os responsáveis pelo seu preenchimento. A enfermagem termina por ser semelhante à de Portugal, mas com muito melhor qualidade e com mais dinheiro para gastar.
A nível de cuidados intensivos, somos muito poderosos com um budget enorme. Cuida-se com qualidade, um enfermeiro por doente, com um quarto privado por pessoa, com uma pessoa a circular para ajudar quem precisa. Investe-se em progressão universitária. Neste momento, 3 tiram a pós graduação (incluido eu), 1 faz o mestrado, e outros fazem artigos de investigação, tudo oferecido pelo hospital, em troca de mais um ano ou dois a trabalhar para aquele hospital.
A equipa é excelente, médicos respeitam enfermeiros e vice-versa, discute-se opiniões, discute-se cuidados e de vez em quando bebemos cerveja todos juntos. Há estatuto, mas não tão acentuado como em Portugal, e eu adoro Inglaterra por isso.
Confirmas que existe uma diáspora de enfermeiros portugueses já visível na Inglaterra?
Sim confirmo e volto a apoiar a mudança. Como disse anteriormente somos muitos naquele hospital, e todas as semanas, a agencia que me levou para Inglaterra leva mais um grupo para outro hospital. Para o meu hospital viemos em 5 grupos, cada um de 20 pessoas, e este mês chegou um sexto grupo. Em qualquer hospital de Inglaterra facilmente se encontra um português a trabalhar lá, sem sombra de dúvidas. Com o resto de emigrantes não enfermeiros, principalmente na área de Stockwell, em Londres, acredito que somos uma enorme comunidade, estando muito próxima à da França.
Satisfeito com a opção?
Muito satisfeito. Trabalho no local que me dá mais prazer, ganho dinheiro suficiente para viajar, tenho em conta que visito 3 países europeus e 1 país fora da europa por ano, consigo ir a portugal todos os 2/3 meses, poupo dinheiro todos os meses, tenho um emprego muito estável. Este ano consegui estar 15 semanas fora do UK, apesar dos 27 dias de férias anuais. O país é lindo, com castelos, paisagems e lagos lindissimos. Para não falar que é um país muito multicultural, pelo que se vê de tudo e se faz de tudo. Sem dúvida recomendo este país de olhos fechados!
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